Experiências Fora do Corpo na Literatura Ocultista e a Visão Cristã
Experiências "Fora do Corpo" na Literatura Ocultista (Pe. Seraphim Rose) - Parte 1/2
1. O Livro Tibetano dos Mortos
2. Os escritos de Emanuel Swedenborg
3. O "Plano Astral" da Teosofia
4. "Projeção Astral"
5. "Viagem Astral"
6. Conclusão sobre o Reino "Fora do Corpo"
Uma Nota sobre Reencarnação
A fim de explicar as experiências "pós-morte" os pesquisadores contemporâneos quase invariavelmente se voltam para aquela forma de literatura que afirma ser baseada na experiência do reino "fora do corpo": a literatura oculta ao longo dos séculos, desde o livro dos mortos egípcio e o tibetano até os mestres e experimentadores oculistas de nossos dias. Quase nenhum desses pesquisadores, por outro lado, prestam qualquer atenção séria ao ensinamento cristão sobre a vida após a morte, ou às fontes escriturísticas e patrísticas sobre as quais se baseia. Por que isso?
A razão é muito simples: o ensinamento cristão provém da revelação de Deus ao homem sobre o destino da alma após a morte, e enfatiza principalmente o estado último da alma no céu ou no inferno. Embora exista também uma abundante literatura cristã descrevendo o que acontece com a alma após a morte, baseada em experiências de primeira mão pós-morte ou fora do corpo (como apresentado no capítulo anterior nos "telônios aéreos"), esta literatura ocupa definitivamente um lugar secundário quando comparado ao ensinamento cristão primário do estado final da alma. A literatura baseada na experiência cristã é muito útil para elucidar e tornar mais vívidos os pontos básicos da doutrina cristã.
Na literatura ocultista, no entanto, exatamente o oposto ocorre: a ênfase principal é sobre a experiência da alma no reino "fora do corpo", ao passo que o estado último da alma é geralmente deixado impreciso ou aberto a opiniões pessoais e suposições, supostamente baseadas nessas experiências. Os pesquisadores de hoje são mais facilmente atraídos pelas experiências de escritores ocultistas (que parecem ser capazes de pelo menos algum grau de "investigação científica") do que para o ensinamento do cristianismo, que exige um compromisso de crença, fé e uma vida espiritual de acordo com ele.
Neste capítulo, tentaremos apontar algumas das armadilhas dessa abordagem, que não é de modo algum "objetiva", como parece a algumas pessoas, e oferecer uma avaliação das experiências ocultas "fora do corpo" do ponto de vista do Cristianismo Ortodoxo. Para que possamos fazer isso, temos de considerar algumas das obras ocultistas que os pesquisadores de hoje estão usando para elucidar as experiências "pós-morte".
1. O Livro Tibetano dos Mortos
O livro tibetano dos mortos é um livro budista do século VIII que provavelmente transmite as tradições pré-budistas de um período muito antigo. Seu título tibetano é "Libertação Através da Escuta no plano Pós-Morte", e é descrito pelo editor inglês como "um manual místico de orientação no outro mundo de muitas ilusões e reinos" (p.2). É lido próximo ao corpo do recém-falecido para benefício da alma, porque, como diz o próprio texto, "durante os momentos de morte ocorrem várias ilusões enganosas" (p.115). Essas, o editor escreve, "não são visões da realidade, mas nada mais do que... os (próprios) impulsos intelectuais que assumiram uma forma personificada" (p.31).
Nos últimos estágios dos 49 dias de experiência pós-morte descritos no livro, há visões de deidades "pacíficas" e "furiosas" - todas as quais, de acordo com a doutrina budista, consideradas ilusórias. (Discutiremos adiante, ao examinar o natureza desse reino, por que essas visões são, de fato, em grande parte, ilusões). O fim de todo esse processo é a descida final da alma em uma "reencarnação" (também discutido abaixo), que os ensinos budistas consideram como um mal a ser evitado pelo treinamento budista. O Dr. C.G Jung, em seu Comentário Psicológico sobre o livro, acha essas visões muito semelhantes às descrições do mundo pós-morte na literatura espírita do ocidente moderno - ambas "dão uma impressão repugnante da absoluta inanidade e banalidade das comunicações do 'mundo espiritual'".
Em dois aspectos há semelhanças notáveis entre o livro tibetano dos mortos e as experiências de hoje, e isso explica o interesse do Dr. Moody e de outros pesquisadores neste livro. Em primeiro lugar, a experiência "fora do corpo" descrita nos primeiros momentos da morte é essencialmente a mesma descrita nas experiências contemporâneas (assim como na literatura Ortodoxa): a alma do falecido aparece como um "corpo ilusório brilhante" que é visível para outros seres da mesma natureza, mas não para os homens na carne; a princípio não sabe se está vivo ou morto; observa as pessoas ao redor do corpo, ouve os gemidos dos lamentos, e tem todas as faculdades sensoriais; tem movimento desimpedido e pode atravessar objetos sólidos (pp. 98-100, 156-160). Em segundo lugar, há uma "nítida luz primária vista no momento da morte", que os pesquisadores contemporâneos identificam com o "ser de luz" descrito por muitas pessoas hoje em dia.
Não há razão para duvidar de que o que está descrito no livro tibetano dos mortos se baseia em algum tipo de experiência "fora do corpo"; mas veremos abaixo que o verdadeiro estado pós-morte é apenas uma dessas experiências e que devemos ter cuidado ao aceitar qualquer experiência "fora do corpo" como uma revelação do que realmente ocorre com a alma após a morte. As experiências de médiuns ocidentais também podem ser genuínas; mas certamente não transmitem mensagens reais dos mortos, como pretendem.
Há uma certa semelhança entre o livro tibetano dos mortos e o mais antigo livro egípcio dos mortos. Este último descreve a alma após a morte passando por muitas transformações e encontrando muitos "deuses". No entanto não existe uma tradição viva de interpretação deste livro e, sem isso, o leitor moderno apenas pode supor o significado de alguns de seu simbolismo. De acordo com este livro, o falecido sucessivamente toma forma de uma andorinha, de um falcão de ouro, de uma serpente com pernas e pés, de um crocodilo, de uma garça, de uma flor de lótus, etc., e encontra estranhos "deuses" e seres de outro-mundo (os "Quatro Sábios Macacos", a deusa do hipopótamo, vários deuses com cabeças de cachorros, chacais, macacos, pássaros, etc.).
As experiências elaboradas e confusas do reino "pós-morte" descritas neste livro contrastam bastante com a claridade e simplicidade das experiências cristãs. Embora também se baseie, como parece, em algum tipo de experiências "fora do corpo" reais , este livro é tão cheio de visões ilusórias como o tibetano dos mortos e certamente não pode ser tomado como uma descrição real do estado da alma pós-morte.
2. Os Escritos de Emanuel Swedenborg
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Outro dos textos ocultistas que os pesquisadores contemporâneos estão investigando que oferece uma maior esperança de ser compreendido, pois é dos nossos tempos modernos, é completamente ocidental em sua mentalidade, e pretende ser Cristão. Os escritos do visionário sueco Emanuel Swedenborg (1688-1722) descrevem as visões de um outro mundo que começaram a aparecer em sua meia-idade. Antes que suas visões começassem, ele era um típico intelectual do século XVIII da Europa, fluente em muitas línguas, um escolar, cientista e inventor, um homem ativo na vida pública, supervisor de indústrias suecas de mineração e membro da Casa dos Nobres - em suma, um "homem universal" nos primeiros anos da ciência, enquanto ainda era possível um único homem dominar quase todo conhecimento de seu tempo. Ele escreveu cerca de 150 trabalhos científicos, alguns dos quais (como seu tratado anatômico de 4 volumes, O Cérebro) estavam bem a frente de seu tempo.
Então, no 56º ano de sua vida, ele voltou sua atenção para o mundo invisível e, nos últimos 25 anos de sua vida, produziu um número imenso de obras religiosas descrevendo o céu, o inferno, os anjos e os espíritos - tudo baseado em suas experiências pessoais.
Emanuel Swedenborg
Suas descrições dos reinos invisíveis são desconcertantemente similares a terra: em geral, no entanto, estão de acordo com a maioria da literatura ocultista. Quando uma pessoa morre, de acordo com o relato de Swedenborg, entra-se no "mundo dos espíritos", que está meio caminho do céu e do inferno. Este mundo, embora seja espiritual e não material, é tão semelhante a realidade material que não se sabe a princípio que morreu (461); ela possui um mesmo tipo de "corpo" e faculdades sensíveis como possuía em seu corpo terreno. No momento da morte há uma visão de luz - brilhante e indistinta- e há uma "revisão" de sua vida e de suas ações boas e más. Ela encontra seus amigos e conhecidos deste mundo (494), e por algum tempo continua uma existência muito semelhante à que tinha na terra, exceto que tudo é muito mais "interior"; atrai-se para aquelas coisas e pessoas pelas quais nutre amor, e a realidade é determinada pelo pensamento - assim que se pensa em um ente querido, tal ente torna-se presente, como se chamado (494). Uma vez que se acostuma a estar neste mundo espiritual, é ensinado por seus amigos sobre céu e inferno, e é levado para várias cidades, jardins e parques (495).
Neste "mundo dos espíritos" intermediário, aquele que faleceu "prepara-se" para o céu em um processo de educação que leva de alguns dias a um ano (498). Mas o "Céu", como descrito por Swedenborg, não é muito diferente do "mundo dos espíritos", e ambos são muito semelhantes à terra (171). Há pátios e salões como na terra, parques e jardins, casas e quartos para "anjos", com muitas mudanças de roupa entre eles. Há governos e tribunais - todos, naturalmente, mais "espirituais" do que na terra. Existem igrejas e serviços religiosos, com clérigos que dão sermões e que ficam confusos se alguém na congregação discorda deles. Há casamentos, escolas, criação e educação de crianças, vida pública - em suma, quase tudo o que pode ser encontrado na Terra que pode se tornar "espiritual". O próprio Swedenborg falou com muitos dos "anjos" no céu (todos esses, ele acreditava, eram apenas as almas dos mortos), bem como com os estranhos habitantes de Mercúrio, Júpiter e outros planetas; ele discutiu com Martinho Lutero no "céu" e o converteu para sua crença, mas não conseguiu convencer Calvino contra a crença na predestinação. "Inferno" é descrito como um lugar semelhante à terra, onde os habitantes são caracterizados por egoísmo e má ações.
Pode-se facilmente entender por que Swedenborg foi considerado pela maioria de seus contemporâneos como um louco, e por que até recentemente suas visões raramente foram levadas a sério. Entretanto, sempre houve alguns que reconheceram que, apesar de todas as estranhezas de suas visões, ele esteve em contato real com a realidade invisível: seu contemporâneo mais jovem, o filósofo alemão lmmanuel Kant, um dos principais fundadores da filosofia moderna, levou-o muito a sério e acreditou nos vários exemplos da "clarividência" de Swedenborg, conhecidos em toda a Europa; e o filósofo americano Emerson, em seu longo ensaio sobre Swedenborg, Homens Representativos, chamou-o de "um dos gigantes da literatura, que não pode ser medido por universidade inteiras de escolares ordinários". Hoje, é claro, a revitalização do interesse pelo ocultismo trouxe-o à tona como um "místico" e "vidente" não vinculado ao cristianismo doutrinário; e, em particular, os pesquisadores de experiências "pós-morte" encontram paralelos notáveis entre suas descobertas e suas descrição dos primeiros momentos após a morte.
Há poucas dúvidas de que Swedenborg esteve em contato real com espíritos invisíveis e que ele recebeu "revelações" deles. Uma análise de como ele recebeu estas "revelações" nos mostrará qual é o verdadeiro reino em que esses espíritos habitam.
A história dos contatos de Swedenborg com os espíritos invisíveis - que ele registrou em grande detalhe em suas volumosas obras Diário dos Sonhos e Diário Espiritual (2300 páginas) - revela precisamente as características de contatos com os demônios do ar, como descrito por Bispo Inácio. Desde a infância Swedenborg praticou uma forma de meditação, envolvendo relaxamento e concentração intensa; com o tempo, passou a ver uma chama esplêndida durante sua meditação, que aceitou com confiança e interpretou como um sinal de "aprovação" de suas idéias. Isto o preparou para a abertura da comunicação com o reino dos espíritos. Mais tarde, ele começou a ter sonhos com Cristo e de ser recebido em uma sociedade de "imortais", e gradualmente tornou-se consciente da presença de "espíritos" em torno dele. Finalmente, os espíritos começaram a aparecer para ele em estado de vigília. A primeira dessas últimas experiências ocorreu quando estava viajando em Londres: uma noite, depois de comer demais, ele de repente viu uma escuridão e répteis rastejando no chão, e então um homem sentado no canto da sala, que disse apenas "não coma muito" e desapareceu na escuridão. Embora estivesse assustado com esta aparição, confiava nela como sendo algo "bom" porque dava conselhos "morais". Então, como ele próprio relatou, "durante a mesma noite o mesmo homem revelou-se a mim novamente, mas eu não estava assustado agora. Ele então disse que era o Senhor Deus, o Criador do Mundo e Redentor, e que me escolhera para explicar aos homens o sentido espiritual da Escritura e que ele mesmo me explicaria o que eu deveria escrever sobre este assunto; naquela mesma noite foi aberto para mim, de modo que fiquei completamente convencido da sua realidade, o mundos dos espíritos, o céu e o inferno... Posteriormente, o Senhor abriu diariamente, muitas vezes, os meus olhos corporais, de modo que no meio do dia eu podia ver o outro mundo, e em estado de perfeita vigília conversar com anjos e espíritos."
É bastante claro a partir desta descrição que Swedenborg começou um o contato com o reino aéreo de espíritos caídos e que todas as suas revelações posteriores vieram desta fonte. O "céu" e o "inferno" que ele viu eram também partes deste reino aéreo, e as "revelações" que ele registrou são uma descrição das ilusões desse reino que os espíritos caídos muitas vezes produzem para os crédulos, com seus próprios objetivos em vista. Um olhar sobre uma outra literatura ocultista nos mostrará mais das características deste reino.
3. O "Plano Astral" da Teosofia
A teosofia dos séculos XIX e XX, que é uma mistura das idéias ocultistas do oriente e do ocidente, ensina em detalhes sobre este reino aéreo, considerando-o composto por vários "planos astrais". ("Astral" vindo de "das estrelas" é um termo fantasioso para se referir ao nível da realidade "além do terreno".) De acordo com um resumo do ensinamento, "os planos (astrais) compreendem as habitações de todas as entidades sobrenaturais, o local dos deuses e os demônios, o vazio onde residem as formas-pensamento, a região habitada pelos espíritos do ar, outros elementos e os vários céus e infernos com seus anfitriões angélicos e demoníacos... Com a ajuda de procedimentos rituais, pessoas treinadas acreditam que podem "ascender nos planos", e experimentar essas regiões em plena consciência."
De acordo com este ensinamento, entra-se no "plano astral" (ou "planos", dependendo se este reino é visto como um todo ou em suas "camadas") na morte e, como no ensino de Swedenborg, não há uma mudança repentina em seu estado e nenhum julgamento; continua-se a viver como antes, apenas fora do corpo, e começa-se a "atravessar todos os sub-planos do plano astral, em seu caminho para o mundo-do-céu". Cada sub-plano é cada vez mais refinado e "interior" e a progressão através deles, longe de envolver temor e a incerteza como fazem os "telônios aéreos" cristãos, é um momento de prazer e alegria: "A alegria da vida no plano astral é tão grande que a vida física em comparação parece não ser vida.... Nove em cada dez não gostam de voltar para o corpo. "(Powell, p.94).
Teosofia, invenção da médium russa Helena Blavatsky, foi fundada no final do século XIX, numa tentativa de dar uma explicação sistemática dos contatos mediúnicos com os "mortos" que se multiplicavam no mundo ocidental desde o grande surto de fenômenos espíritas na América em 1848. Até hoje seu ensino sobre o "plano astral" (embora muitas vezes não chamado por esse nome) é o padrão usado por médiuns e outros amadores no ocultismo para explicar suas experiências no mundo dos espíritos. Embora os livros teosóficos sobre o "plano astral" estejam preenchidos com a mesma "inanidade repugnante e banalidade" que o Dr. Jung utiliza para caracterizar toda a literatura espírita, ainda assim, atrás desta banalidade há uma filosofia subjacente básica da realidade do outro mundo que encontra simpatia nos investigadores contemporâneos. A visão de mundo humanista atual está mais favoravelmente disposta para um outro mundo que é agradável ao invés de doloroso, que permite um "crescimento" ou "evolução" tranquila em vez da finalidade do juízo, que permite "outra chance" de preparar-se para uma realidade superior em vez de determinar o destino eterno de alguém pelo comportamento na vida terrena. O ensinamento da teosofia dá exatamente essas características exigidas pela "alma moderna" e afirma que baseia-se na experiência.
A fim de dar uma resposta cristã ortodoxa a este ensinamento, devemos examinar mais de perto as experiências específicas que são ocorrem no "plano astral." Mas onde vamos examinar? A comunicação dos médiuns são notoriamente não confiáveis e incertas. O contato feito com o "mundo espiritual" através dos médiuns é muito sombrio e indireto para constituir prova convincente da natureza desse mundo. As experiências "pós-morte" de hoje, por outro lado, são muito breves e inconclusivas para serem tomadas como evidência da natureza real do outro mundo.
Mas existe uma espécie de experiência no "plano astral" que pode ser estudada com mais detalhes: na linguagem teosófica é chamada "projeção astral" ou "projeção do corpo astral". É possível, através do desenvolvimento de certas técnicas mediúnicas, não apenas entrar em contato com espíritos desencarnados, como fazem os médiuns comuns (quando suas sessões são genuínas), mas realmente entrar em seu reino e "viajar" em seu meio. Pode-se muito bem ser cético ao ouvir tais experiências em tempos antigos, mas acontece que essa experiência se tornou relativamente comum - e não apenas entre os ocultistas - em nossos tempos, e já há uma extensa literatura de experiência de primeira mão neste reino.
4. “Projeção Astral"
É bem conhecido ao cristão ortodoxo que o homem pode, de fato, ser elevado além das limitações de sua natureza corporal e viajar até reinos invisíveis. A natureza exata dessa viagem não nos interessa aqui. O próprio apóstolo Paulo não sabia se estava "no corpo ou fora do corpo" quando foi elevado até o terceiro céu (II Cor. 12: 2), e não há necessidade de especular sobre como o corpo pode tornar-se suficientemente refinado para entrar no céu (se sua experiência realmente foi "no corpo"), ou que tipo de "corpo sutil" a alma pode ser revestida durante uma experiência "fora do corpo" - se, de fato, essas coisas possam ser conhecidas nesta vida. Nos é suficiente saber que a alma (em qualquer tipo de "corpo") pode realmente ser elevada pela graça de Deus e contemplar o paraíso, bem como o reino aéreo dos espíritos abaixo do céu.
Muitas vezes, na literatura ortodoxa, tais experiências são descritas como "fora do corpo", assim como a experiência de Santo Antônio dos "telônios aéreos" enquanto estava em oração, descritas acima. O bispo Inácio Brianchaninov menciona dois ascetas no século XIX, cujas almas também deixaram seus corpos enquanto estavam em oração - o ancião Basilisk da Sibéria, cujo discípulo era o famoso Zosima, e ancião-schema Inácio (Isaiah), amigo pessoal do Bispo Inácio (Bispo Inácio, Obras Completas, vol. III, p. 75). A mais impressionante experiência "fora do corpo" nas vidas dos santos ortodoxos é provavelmente a de Santo André o Tolo-por-Cristo de Constantinopla (século X), que, embora seu corpo evidentemente estivesse na neve nas ruas da cidade, foi elevado em espírito para contemplar o paraíso e o terceiro céu, uma parte da qual ele descreveu ao seu discípulo que registrou sua experiência (Vidas dos Santos, 2 de outubro).
Essas experiências ocorrem somente pela graça de Deus e completamente à parte da vontade ou desejo dos homens. Mas "projeção astral" é uma experiência "fora do corpo" que pode ser buscada e iniciada por meio de certas técnicas. Esta experiência é uma forma especial daquilo que Bispo Inácio descreve como a "abertura dos sentidos" e é claro que - uma vez que o contato com espíritos é proibido aos homens, exceto pela ação direta de Deus - o reino que pode ser alcançado por este meio não é o céu, mas apenas o reino aéreo abaixo do céu, o reino habitado pelos espíritos caídos.
Os textos teosóficos que descrevem esta experiência em detalhes estão tão cheios de opiniões e interpretações ocultas que são em grande parte inúteis para dar uma idéia das experiências reais desse reino. No século XX, no entanto, houve outro tipo de literatura que tratou dessa experiência: paralelo ao surgimento de pesquisas e experiências no campo da "parapsicologia" alguns indivíduos descobriram, por acidente ou por experiência, que eram capazes de ter a experiência de "projeção astral" e eles escreveram livros descrevendo suas experiências em linguagem não-ocultista e alguns pesquisadores compilaram e estudaram relatos de experiências "fora do corpo", escrevendo numa linguagem científica ao invés de uma linguagem ocultista. Aqui examinaremos vários desses livros.
O lado "terreno" das experiências "fora do corpo" é bem descrito em um livro do diretor do Instituto de Pesquisas Psico-físicas de Oxford, Inglaterra. Em resposta a um apelo feito em setembro de 1966, na imprensa britânica e no rádio, o Instituto recebeu cerca de 400 respostas de pessoas que alegaram ter tido experiências pessoais fora do corpo. Tal resposta indica que essas experiências não são raras em nossos dias e que aqueles que as tiveram estão muito mais dispostos do que em anos anteriores a discuti-las sem medo de serem considerados "loucos". O Dr. Moody e outros pesquisadores descobriram as mesmas coisas em relação às experiências "pós-morte". Essas 400 pessoas receberam dois questionários para preencher, e o livro foi o resultado de uma comparação e análise das respostas desses questionários.
As experiências descritas neste livro foram quase todas involuntárias, desencadeadas por várias condições físicas: estresse, fadiga, doença, acidente, anestesia, sono. Quase todas ocorreram na proximidade do corpo (não em um reino "espiritual"), e as observações feitas são muito semelhantes às feitas por pessoas que tiveram experiências "pós-morte": veem o próprio corpo de "a partir de fora", possuem todas as faculdades sensíveis (mesmo se em corpo fosse surdo ou cego), são incapazes de tocar ou interagir com o ambiente, "flutuam" no ar com uma sensação de extrema tranquilidade e bem-estar; a mente torna-se mais clara do que o normal. Algumas pessoas descreveram encontro com parentes falecidos ou viagens para paisagens que não pareciam fazer parte da realidade comum.
Um investigador de experiências "fora do corpo", o geólogo inglês Robert Crookall, reuniu uma enorme quantidade de exemplos, tanto de ocultistas como médiuns, por um lado, e de pessoas comuns, por outro. Ele resume a experiência da seguinte maneira: "Um corpo-réplica, ou 'duplo' 'nasceu' do corpo físico e assumiu uma posição acima dele. Com o 'duplo' separado do corpo, houve um 'apagão' na consciência (assim como a mudança de engrenagens em um carro causa uma ruptura momentânea na transmissão de potência)... Muitas vezes, houve uma revisão panorâmica da vida passada, e o corpo físico abandonado é comumente visto a partir do 'duplo' liberto... Ao contrário do que seria de esperar, ninguém descreveu sobre dor ou o medo causado por deixar o corpo - tudo parecia perfeitamente natural... A consciência, que operava através do 'duplo' separado, era mais extensa do que na vida comum... Às vezes, havia telepatia, clarividência e presciência. Os amigos "mortos" eram vistos frequentemente. Muitos dos depoentes expressaram grande relutância para voltar a entrar no corpo e, assim, retornar à vida terrena ... Este padrão geral de eventos em experiências fora do corpo, até então não reconhecidas, não pode ser explicado adequadamente pela hipótese de que todas essas experiências eram sonhos e que todos os duplos descritos eram meras alucinações. É possível, por outro lado, ser prontamente explicado pela hipótese de que essas eram experiências genuínas e que os 'duplos' eram corpos objetivos (embora ultrafísicos)".
Esta descrição é praticamente idêntica, ponto a ponto, com o "modelo" do Dr. Moody de experiências pós-morte (Life After Life, p. 23-24). Essa identidade é tão precisa que só pode ser uma e a mesma experiência que está sendo descrita. Se assim for, é finalmente possível definir a experiência que o Dr. Moody e outros investigadores descreveram, e que causou tanto interesse e discussão no mundo ocidental por vários anos. Não é exatamente uma experiência "pós-morte"; é antes a experiência "fora do corpo", que é apenas a antecâmara para outras experiências muito mais extensas, seja da própria morte ou do que às vezes se chama "viagem astral" (que veremos mais adiante). Embora o estado "fora do corpo" possa ser chamado de "primeiro momento" da morte - se a morte realmente segue - é um erro grosseiro concluir com isso qualquer coisa sobre o estado "pós-morte", a menos que seja os fatos simples da sobrevivência e da consciência da alma após a morte, que quase ninguém que realmente acredita na imortalidade da alma nega de qualquer maneira. Além disso, pelo fato do estado "fora do corpo" não estar necessariamente vinculado à morte, devemos ser extremamente discernentes ao filtrar as evidências fornecidas por experiências extensas neste reino; em particular, devemos perguntar se as visões do "céu" (ou "inferno") que alguns estão experimentando hoje têm algo a ver com a verdadeira compreensão cristã do céu e do inferno, ou se são apenas algumas interpretações meramente naturais (ou demoníacas) do reino "fora do corpo".
O Dr. Crookall - que tem sido o investigador mais minucioso neste campo até agora, aplicando a mesma cautela e preocupação por detalhes que caracteriza seus livros anteriores sobre as plantas fósseis da Grã-Bretanha - reuniu muito material sobre experiências do "paraíso" e "hades". Ele as considera como experiências naturais e virtualmente universais no estado "fora do corpo", e as distingue da seguinte maneira: "Aqueles que deixaram seus corpos naturalmente tendiam a vislumbrar condições brilhantes e tranquilas ("paraíso"), uma espécie de terra gloriosa; enquanto (aqueles que foram) expulsos à força... tendiam a se encontrar em condições relativamente obscuras, confinadas, como sonhos que correspondem ao "hades" dos antigos. No primeiro encontrou muitos ajudantes (incluindo os amigos e parentes "mortos" já mencionados); o último, às vezes, encontrou desencarnados que o impedia" (p. 14-15). As pessoas que possuíam o que o Dr. Crookall chama de "constituição corporal mediúnica" passam invariavelmente em primeiro lugar por uma região negra e nebulosa do "hades" e então por uma região de luz radiante que parece o paraíso. Este "paraíso" é descrito de forma variada (tanto por médiuns como não-médiuns) como "o cenário mais bonito já visto", "uma cena de beleza espantosa - um vasto jardim como um parque e a luz de lá é uma luz que nunca foi vista no mar ou na terra", "paisagem encantadora" com "pessoas vestidas de branco" (p. 117), "a luz torna-se intensa", "toda a terra estava brilhante" (p.127) .
Para explicar essas experiências, Dr. Crookall admite a existência de uma "terra total" que compreende, no nível mais baixo, a terra física que conhecemos no cotidiano, cercada por uma esfera não-física interpenetrante com faixas de "hades" e "paraíso" nos limites inferior e superior (p. 87). Isto é, aproximadamente, uma descrição do que na linguagem ortodoxa é conhecido como o reino aéreo dos espíritos caídos do sub-céu, ou o "plano astral" da teosofia; as descrições ortodoxas desse reino, no entanto, não fazem distinções "geográficas" entre "superior" e "inferior" e enfatizam os enganos demoníacos que são parte integrante desse reino. O Dr. Crookall, pesquisador secular, nada sabe sobre esse aspecto do reino aéreo, mas ele testemunha, do ponto de vista "científico", um fato extremamente importante para a compreensão das experiências "pós-morte" e "fora do corpo": o "paraíso" e "inferno" visto por pessoas nestas experiências são apenas partes (ou aparências) do reino aéreo dos espíritos e não tem nada a ver com o verdadeiro céu e o inferno da doutrina cristã, que representam as eternas moradias das almas humanas (e de seus corpos ressuscitados), bem como dos espíritos imateriais. As pessoas no estado "fora do corpo" não são livres para "vagar" no verdadeiro céu e no inferno, que são abertos às almas apenas pela vontade expressa de Deus. Se alguns "cristãos" na "morte" vêem quase imediatamente uma "cidade celestial" com "portões perolados" e "anjos", é apenas uma indicação de que o que se vê no reino aéreo depende, em certa medida, das próprias experiências e expectativas do passado; mesmo os hindus moribundos vêem seus templos e seus "deuses". As verdadeiras experiências cristãs do céu e do inferno (como veremos no próximo capítulo) são de dimensões completamente diferentes.
Fonte: http://skemmata.blogspot.com/2017/09/experiencias-fora-do-corpo-na.html?fbclid=IwAR1TXvHprFHVd5Pb80pvGEZvFVK38WEpukFA6L3TQzwow06blNjoSFAYZuI
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